12 junho, 2014

‘’Aprender mais e passar para as pessoas que não puderam vir’’

Intercâmbio Estadual

Jardim da dona Cida
Há aproximadamente um mês a Comitiva Mandacaru, isso mesmo, agora a comitiva que antes era apenas chamada de comitiva, agora intitulada: COMITIVA MANDACARU. Nome escolhido por agricultores e agricultoras dos municípios de Queimadas, Nordestinas e Cansanção. A ideia surgiu durante os intercâmbios municipais e estaduais promovidos pelo Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), da Articulação no Semiárido Brasileiro - ASA em parceria do Banco de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES e executado pela Associação dos Pequenos Agricultores Familiares - APAEB Serrinha. Durante o municipal, o grupo apenas  chamava de comitiva, mas neste último, o interestadual, realizado na terra do caju, Sergipe, deram lhe um nome: Comitiva Mandacaru, isso por que a planta é típica da caatinga e ainda avisa ao sertanejo através da sua flor quando a chuva está por vir.

O intercambio já começou no corredor do ônibus. A troca de experiência já era visível. Pois muitos dos agricultores (a) tinham participado do intercambio municipal. Daí foi àquela troca, aquele questionamento do que cada um já tinha feito em sua propriedade. Dona Viviane Reis, do município de Queimadas, por exemplo, logo socializou que já tinha feito à cobertura de palma e com capim, a qual tinha aprendido durante a visita na casa do seu Abel Manto, na comunidade de Mucambo, em Riachão do Jacuípe,durante o intercambio municipal.
A viagem era longa, porém nem foi percebida, pois no interior do ônibus o antídoto para curar o cansaço e o sono foi revelado pelos agricultores e agricultoras presentes: cantigas de rodas, cantigas de São João, cantigas de Reis, além de adivinhas e piadas.

  Cantiga de roda cantada durante a viagem.

Pedra do amolador

‘’Olha a pedra do amolar, olha a pedra do amolador, mais quando soube que tu era noivo eu chorava tanto que fazia dó.
Sete e sete são quatorze, com mais sete vinte um, eu tenho sete amor no mundo mais não amo nenhum.
Olha a pedra do amolar, olha a pedra do amolador, mais quando soube que tu era noivo eu chorava tanto que fazia dó’’.

Nesse ritmo cultural e alegre desembarcaram em Sergipe repleto de grandes expectativas. Para alguns não seria novidade apenas conhecer novas experiências de lidar com a terra. Para muitos era a primeira vez que estavam saindo do Estado da Bahia, portanto, todo detalhe era novo, era surpreendente, tudo fazia o olhar brilhar.
As primeiras falas dos agricultores (a) no momento de apresentação e expectativas eram unanime: aprender mais e passar para as pessoas que não puderam vir.

O primeiro encontro da Comitiva Mandacaru foi  na Associação de Mulheres – Resgatando Vidas, na Comunidade Lagoa da volta, no Município de Porta da Folha. Lá os agricultores puderam trocar experiências sobre produção de doces, geleias, compotas, cultivo de hortaliças entre outras. Enquanto dona Luzinete, carinhosamente conhecida como Netinha, falava os olhos de algumas agricultoras que já desenvolvem esta atividade, brilhavam, como é o caso das agricultoras Dona Ananias e Dona Noelia que fazem parte do grupo de mulheres da comunidade de Deus Dará do Município de Nordestina. 
De repente um barulho familiar para muitos,mais estranho para alguns chamou atenção,todos saíram para fora da Associação,se tratava de um carro de boi. Foi um alegria, pois apesar de por muitos anos ter sido meio de transporte de cargas e até de pessoas de muitos agricultores (a) nos municípios presentes no intercambio está praticamente extinto. Todos queriam registrar, tirar fotos,para mostrar para os filhos,foi uma festa só.
Carro de Boi
Há poucos metros dali, numa casa repleta de plantas espalhadas pelo quintal, pelas curiosidades dos agricultores e agricultores via-se que se tratava de uma família que era exemplo local de agricultura familiar, soberania alimentar e sustentabilidade. A propriedade é da dona Cida Alves, agricultora experimentadora, e multiplicadora. Em uma tarefa de terra dona Cida desenvolve o plantio de hortaliças, fruteiras, plantas medicinais, verduras além da criação de um pequeno rebanho de ovelhas. A cada passo que a nossa agricultora sergipana dava pela sua propriedade era seguida pelos olhos e pelos passos de todos, cada ensinamento passado por ela era anotado em cadernetas trazidas por cada agricultor (a). Quando viam uma novidade, logo interrogavam. Quando se tratava de uma planta queriam uma muda para ver se nascia aqui em solo baiano. Foi o caso da agricultora Natália, do município de Cansanção, que não trocou apenas conhecimento, e não trouxe na bagagem apenas novas experiências, trouxe também uma muda de uma planta nativa do Estado de Sergipe.
No terreno da dona Cida a nossa Comitiva Mandacaru também se deparou com algo que para alguns já faz parte do cenário das propriedades deles: uma cisterna-calçadão. Dona Cida mostrou para os agricultores (a) que não é preciso muito recurso para se produzir ao redor da cisterna, pois ela utiliza pedras para formar os canteiros econômicos para o cultivo de hortaliças. 
No fundo do quintal, um circo feito de cimento chamou atenção para alguns. Era o biodigestor conquistado por dona Cida. Em poucos minutos se fez um circulo humano em torno dele. Todos queriam saber seu funcionamento, o que era necessário para o mesmo gerar gás. Com a sutileza e alegria sergipana dona Cida passou todas as informações e respondeu todos os questionamentos feitos por eles e ainda mostrou de fato que realmente o gás existe, para alegria de todos.
Biodigestor conquistado por D.Cida
Antes do entardecer a Comitiva Mandacaru seguiu cantarolando, desta vez rumo à cidade Canindé de São Francisco-SE. O objetivo era conhecer a Cooperativa Casa do Mel. Por lá os agricultores (a) foram recebidos por Josiel Ferreira da Silva, mais conhecido por Téo do mel. Téo Fez um breve socialização sobre o trabalho desenvolvido na Casa do Mel, abriu espaço para as dúvidas e levantou muitos questionamentos ao falar: ‘’qualquer um pode criar abelha. Só querer e ter aptidão’’. Apesar da maioria do grupo não ter experiência com o criatório de abelhas, todos estavam curiosos para saber de fato como funcionava, se tinha mistério. Curiosidades que foram sanadas quando Téo do Mel apresentou cada detalhe da cooperativa para os agricultores, desde a manipulação ao envasamento do mel.
Para seu José Ribeiro, que tem uma pequena criação de abelhas, na sua propriedade na comunidade de Lago do Frade em Cansanção, ver uma estrutura daquele tamanho serviu para ele perceber que está no caminho certo, e que tudo o que foi apresentado ele irá levar para a cooperativa da região para ser seguido.
‘’muita coisa que foi falado lá eu já faço,mas aprendi algumas coisas também. Os maquinários que eles tem, esses sim, vou falar para o pessoal da nossa cooperativa que por sinal também chama Casa do Mel, para gente ver se consegue recursos para adquirir,pois, ajuda muito. Declarou seu José Ribeiro.
Sala de Manipulação
Apesar das horas de viagem, dos dias foras de casa, do cansaço, ainda sobrou gás para entoar mais cantigas de rodas e outras mais. O Intercâmbio Estadual deixa a certeza que os agricultores e agricultoras voltam para a casa com uma bagagem que como eles mesmo disseram acima, vão passar adiante, além de terem deixado um pouquinho da Bahia também em terra sergipana,pois os intercâmbios são feitos disso,de trocas de conhecimentos e saberes.